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quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Capítulo 2 – De Haifa aos confins da terra


Capítulo 2 – De Haifa aos confins da terra


Era mês de dezembro de 1952, em Haifa, Israel.
Clemence Hinn, prestes à dar a luz ao seu segundo filho, se achava no hospital olhando para uma bela paisagem da janela do quarto da maternidade. As águas de um azul profundo do Mediterrâneo se estendiam até o infinito. Mas o coração daquela pequena mulher armênia estava perturbado, abalado pela amargura, medo e vergonha.
Podia divisar ao longe o aglomerado de rochas no mar, os Rochedos de Andrômeda.
A lenda grega afirma que a jovem Andrômeda estava acorrentada a um deles quando Perseu apareceu voando em seu cavalo alado, matou o monstro marinho e a salvou.
Clemence queria que alguém descesse de algum modo e a salvasse de outro ano de humilhação e desgraça. Ela era uma grega ortodoxa piedosa, mas não sabia muito sobre o Senhor. Naquele quarto humilde de hospital, ela tentou, porém, fazer um trato com Ele.
Enquanto permanecia na janela, seus olhos sondavam o céu, e falou do fundo do coração: - Deus, só tenho um pedido. Se me der um menino, eu o devolvo ao Senhor. Ela repetiu: – Por favor, Deus. Se me der um menino, eu o devolvo ao Senhor.

Haifa

Seis lindas rosas


O primeiro filho de Constandi e Clemence Hinn foi uma bela menina, chamada Rose. Mas na cultura inflexível do Oriente Médio – e especialmente na tradição ancestral dos Hinn – o primogênito deveria ser um filho e herdeiro.
A família de Contandi, que imigrara da Grécia para a Palestina, começou a perseguir Clemence por seu fracasso em produzir menino. – Como sabe, – censuravam eles – todas as suas cunhadas tiveram meninos. Eles zombavam e escarneciam até que chorasse e ela sentia embaraço e a vergonha num casamento que seus pais tinham arranjado tão cuidadosamente.
Seus olhos continuavam úmidos naquela noite ao pegar no sono. Durante a noite teve um sonho de que lembra até hoje – Vi seis lindas rosas em minha mão – diz ela. E vi Jesus entrar em meu quarto. Ele veio e pediu que lhe desse uma e eu entreguei.
Enquanto o sonho continuava, um jovem baixo e magro, de cabelos negros (ela lembra cada traço do seu semblante), se aproximou e envolveu-a num tecido quente.
Ao despertar ela se perguntou: – Qual o significado desse sonho? O que será?
No dia seguinte, três de dezembro de 1952, eu nasci.
Nossa família viria a ter no futuro seis meninos e duas meninas, mas minha mãe jamais se esqueceu do seu trato com Deus. Ela contou-me mais tarde o seu Sonho e disse que eu era a rosa que entregou a  Jesus.
Fui batizado na igreja Ortodoxa Grega pelo patriarca de Jerusalém, Benedictus. De fato, durante a cerimônia ele me deu esse nome.
Nascer na Terra Santa significava ter vindo ao mundo numa atmosfera onde a religião lança uma grande sombra inevitável. Aos dois anos fui matriculado numa pré-escola católica e ensinado formalmente por freiras e mais tarde por monges, durante quatorze anos.
Haifa era para mim uma linda cidade. A palavra quer dizer exatamente isso – linda.
Haifa em árabe, Jope em grego antigo, ou Yafo em hebraico. Em qualquer idioma, o sentido é o mesmo.
Quando menino, eu gostava muitíssimo de ouvir a história do lugar onde vivia.
Haifa foi fundada antes de serem iniciados os registros.
Ela é mencionada como uma cidade cananita na lista de tributos do Faraó Tutmos II no século XV  A.C., antes de Josué ter travado a batalha de Jericó. Foi nela que o rei fenício de Tiro, Hirão, descarregou madeira de cedro para o templo de Salomão.
Embora fascinante, a história não fora bondosa com a minha cidade. Haifa tinha sido invadida, capturada, destruída e reconstruída várias vezes. Simão Macabeu, Vespasiano, os mamelucos, Napoleão e Allenby, todos se apossaram dela.
Haifa veio a ser colocada em uma nova nação, o estado profetizado de Israel, só seis anos antes do meu nascimento. Mas a comunidade propriamente dita não era judia.

O prefeito Hinn

Meu pai foi prefeito de Haifa durante a minha infância. Ele era um homem forte, com cerca de 1,85m e 120kg e uma  capacidade natural para a liderança. Era forte em todos os sentidos – fisicamente, mentalmente e na sua vontade férrea.
Sua família imigrara da Grécia para o Egito antes de estabelecer-se na Palestina.
Mas “ser de outro lugar” era comum. Haifa da minha infância era verdadeiramente uma cidade cosmopolita.
Andando pela Rua Raziel e entrando na Tower Square onde se acha a Abdul Hamid Jibilee Clock Tower, a cadeia com muros de pedra, e a Grande Mesquita, construída em 1810, eu podia ouvir os habitantes conversando em francês, búlgaro, árabe, e outros idiomas. Nos quiosques e cafés ao ar livre, eu saboreava baklava , zlabiya, falafel, sum-sum, e dúzias de outras delícias.
Ali estava eu então, nascido em Israel, mas sem ser judeu. Criado numa cultura árabe, mas não de origem árabe. Freqüentando escola católica, mas educado como grego ortodoxo.
As línguas são fáceis de aprender nessa parte do mundo. Eu pensava que todos deveriam falar três ou quatro delas. Nós usávamos o árabe em nossa casa, mas na escola as freiras católicas ensinavam em francês, exceto o Antigo Testamento, que era estudado em hebraico antigo.
Durante minha infância, os cem mil habitantes de Haifa haviam sido engolidos pela população judia de Tel Avive, em explosão para o norte. A metrópole hoje tem o nome oficial de Tel Avive Haifa. Mais de quatrocentas mil pessoas vivem nessa área.
Tel Avive começou na verdade com uma experiência judia em 1909, quando sessenta famílias compraram 32 acres de dunas arenosas desguarnecidas ao norte de Haifa e foram se estabelecer ali. Elas estavam cansadas do confinamento e do ruído dos quarteirões árabes onde viviam. A expansão continuou até que Tel Avive se tornou a maior cidade de Israel.
Embora meu pai não fosse judeu, os líderes israelitas confiavam nele. E ficaram felizes em ter alguém em Haifa que pudesse comunicar-se com uma comunidade internacional. Tínhamos orgulho do seu círculo de amigos, que incluía muitos líderes nacionais. Ele foi convidado para ser embaixador de Israel em países estrangeiros, mas preferiu permanecer em Haifa.
A família não recebia, porém muito do seu tempo. Eu não posso, na verdade, dizer que conhecia meu pai naquela época. Sua presença parecia ser sempre exigida em alguma função oficial ou reunião importante.
Meu pai não era uma pessoa extrovertida, mas rigorosa, e raramente manifestava qualquer sinal de afeição. (Minha mãe, no entanto, supria essa deficiência). Isso fazia também parte da cultura. Homens eram homens.
Vivíamos confortavelmente. A posição de meu pai no governo possibilitava a manutenção de uma casa nos subúrbios. Era uma linda casa, rodeada por muros altos, com cacos de vidro na parte superior para segurança. Minha mãe podia ser chamada de dona de casa na acepção da palavra, pois criar aquela prole de pequenos Hinn era tarefa de tempo integral.

Um casulo católico

À medida que minha educação prosseguiu, passei a considerar-me católico. O processo foi iniciado bem cedo.  A pré-escola que eu freqüentava era, na verdade, uma espécie de convento, onde se celebrava regularmente a missa. Meus pais não protestavam, porque uma educação na escola católica era considerada a melhor possível.
Nos dias de semana eu estudava com as freiras, e no domingo ia à igreja ortodoxa grega com mamãe e papai.  Isso não constituía um problema na poliglota Haifa. A lealdade a uma igreja específica não importava tanto.
Eu era católico? Completamente. O catolicismo era a minha vida de oração. Ele ocupava meu tempo e atenção cinco dias por semana. Tornou-se a minha mentalidade. Eu praticamente morava no convento e, nesse casulo, me distanciei muito do mundo.
Fui também separado do mundo de um modo infeliz. Desde a minha tenra infância sofria de forte gagueira. À menor pressão social ou nervosismo eu começava a gaguejar, sendo isso para mim quase insuportável. Achava difícil fazer amigos. Algumas crianças zombavam de mim e outras apenas se mantinham distantes.
Eu não sabia quase nada dos acontecimentos mundiais, apenas o que meus professores queriam que soubesse. Mas era um conhecedor da vida católica. No decorrer de minha educação, passei a estudar no College de Freres (Colégio dos Irmãos) e fui ensinado por monges.
Mesmo quando pequeno, eu já era extremamente religioso. Orava e orava, provavelmente mais do que alguns cristãos oram hoje. Mas sabia apenas a Ave Maria, o Credo, o Pai Nosso e outras orações prescritas.
Só raramente eu falava de fato com o Senhor. Quando tinha um pedido específico, eu o mencionava. Por outro lado, minha vida de oração era muito organizada, muito rotineira.
O principal conceito parecia ser: “Você deve sofrer quando ora”. E isso era fácil.
Não havia praticamente onde ajoelhar, exceto nas pedras brancas de Jerusalém que estavam em toda a parte. Quase todas as casas são construídas desse material. As escolas que freqüentei não tinham carpete, só um chão simples de pedra branca.
Acabei por acreditar que se você não sofresse com a súplica, o Senhor não iria ouvi-lo, que o sofrimento era o melhor meio de obter o favor de Deus.
Embora quase nenhuma espiritualidade acompanhasse o ensino, continuo sendo grato à base bíblica que recebi. Penso muitas vezes: – Quantas crianças aprenderam o Antigo Testamento em hebraico? E nossas viagens campestres tornavam literalmente viva a palavra de Deus. Visitamos certa vez o Neguebe, onde chegamos perto dos poços que Abraão cavara, aprendendo a respeito dele. Essa experiência ficara comigo para sempre.

Suas vestes eram mais alvas que a neve.

Deus tem falado comigo várias vezes durante a minha vida através de visões. No decorrer de meus anos em Haifa, isso só aconteceu uma vez, quando eu não passava de um garoto de onze anos.
Creio que foi nessa ocasião que Deus começou a mover-se em minha vida. Posso lembrar da visão como se tivesse sido ontem. Eu vi Jesus entrar em meu quarto. Ele usava trajes mais alvos que a neve e um manto vermelho escuro drapejado sobre a veste.
Vi seu cabelo. Olhei em seus olhos. Vi os sinais dos cravos em Suas mãos. Vi tudo.
É preciso que compreenda que eu não conhecia a Jesus. Eu não pedira que entrasse em meu coração. Mas no momento em que O vi, eu O reconheci. Sabia que era o Senhor.
Quando isso aconteceu, eu estava dormindo, mas de repente uma sensação incrível, que só pode ser descrita como “elétrica”, tomou conta do meu pequeno corpo. Era como se alguém tivesse me ligado numa tomada. Senti um formigamento como de agulhas – milhares delas- percorrendo meu organismo. O Senhor ficou então diante de mim enquanto eu dormia profundamente. Ele olhou diretamente para mim com os olhos mais belos que já contemplara. Ele sorriu e Seus braços estavam bem abertos. Eu podia sentir a Sua presença.
Foi maravilhoso e jamais esquecerei.
O Senhor não me disse uma palavra. Ele apenas olhou para mim, e depois desapareceu.
Acordei imediatamente. Eu mal conseguia entender o que acontecera, mas não fora um sonho. Deus permitiu que eu tivesse essa visão que causasse uma impressão indelével em minha jovem vida.
Quando acordei, a sensação extraordinária ainda perdurava. Abri os olhos e olhei ao redor, mas o sentimento intenso e poderoso continuava em meu íntimo. Sentia-me totalmente paralisado, não podia mover nenhum músculo. Nem uma pestana. Achava-me completamente congelado ali. Todavia, mantinha o controle. Esse sentimento invulgar me envolveu, mas não me dominou.
Eu estava certo de que se dissesse: – Não, não quero isso – a experiência teria sumido. Mas, eu não disse nada.  Enquanto me mantinha ali, acordado, o sentimento predominou e depois foi embora lentamente.
De manhã contei a experiência a minha mãe e ela ainda se lembra do que disse: – Você deve ser um santo.
Coisas assim não aconteciam às pessoas em Haifa, quer fossem católicas ou gregos ortodoxos. É claro que eu não era um “santo”, mas minha mãe acreditava que, se Jesus viera até mim, Ele deveria estar me separando para um chamado superior.
Enquanto Deus tocava minha vida, outros fatores que iriam mudar completamente o futuro de minha família começavam a operar.

Até os confins da terra.

De Gaza às colinas de Golan

Como eu morava em Israel, na década de 60, estava a par da tensão política crescente. As incursões árabes no território de Israel eram quase diárias ao longo das fronteiras que dividiam o Egito da Jordânia e da Síria. E o exército de Israel retaliava regularmente, atacando com suas tropas.
Em maio de 1967, Israel e os três países árabes alertaram suas forças armadas para a possibilidade de uma guerra. A pedido do Egito, as tropas das Nações Unidas deixaram a faixa de Gaza e a Península do Sinai.
A seguir, no dia cinco de junho de 1967, os aviões de Israel atacaram os campos de aviação do Egito, Jordânia e Síria. Esse conflito foi chamado de Guerra dos Seis Dias. Em menos de uma semana, os israelitas destruíram quase completamente as forças aéreas árabes. As tropas israelitas ocuparam a Faixa de Gaza, a Península do Sinai, a Margem Ocidental, e as Colinas Sírias de Golan. Israel dominou em pouco tempo o território árabe, totalizando mais de três vezes sua extensão de terra original.
Jamais esquecerei o dia, em princípios de 1968, em que meu pai reuniu a família e nos contou que estava fazendo planos para migrarmos. Ele nos disse: – Por favor, não discutam o assunto com ninguém, porque pode haver problemas com nossos vistos de saída.
O plano inicial era nos mudarmos para a Bélgica. Meu pai tinha ali alguns parentes e a idéia de mudar para um país de fala francesa parecia excitante. Afinal de contas, eu fora educado nesse idioma.
Certa noite um adido da embaixada canadense visitou-nos para mostrar um filme de curta metragem sobre a vida no Canadá. Toronto parecia uma cidade florescente. Dois irmãos do meu pai viviam ali, mas nós duvidávamos que estivessem financeiramente qualificados para serem nossos patrocinadores oficiais.
Os problemas ligados à nossa partida pareciam crescer a cada dia. Houve uma ocasião em que meu pai informou que talvez não pudéssemos deixar o país antes de cinco anos.

Eu fiz um trato com Deus

A essa altura estávamos tão ansiosos para partir que me ajoelhei naquelas pedras de Jerusalém e fiz um voto a Deus: – Senhor, – orei – se o Senhor nos tirar daqui, eu lhe farei o maior frasco de óleo de oliva que puder encontrar. – e acrescentei: – Quando chegarmos a Toronto, eu o levarei à igreja e o oferecerei ao Senhor em ação de graças.
No ambiente em que eu crescera, fazer tratos com Deus não era coisa incomum. E o óleo de oliva era um artigo de alto preço. Fiz então o voto.
Dentro de poucas semanas, um jovem da embaixada canadense telefonou a meu pai para dizer:– Sr. Hinn, arranjamos tudo, não me pergunte como. Todos os seus papéis estão em ordem e o senhor pode partir quando quiser.
Não demorou muito. Vendemos quase todos os nossos bens e nos preparamos para uma nova vida na América do Norte.
Naqueles últimos dias na Terra Santa, eu tive uma sensação intensa de que alguma coisa grandiosa estava para acontecer. Eu sabia que ia deixar uma cidade especial, mas sentia que o melhor ainda estava por vir.
Jonas embarcou no porto da antiga cidade de Jope, a minha Haifa. E o resultado foi a salvação de Nínive.
Quantas vezes eu subia à Cidadela, o alto monte que ficava a cavaleiro do porto.
Junto ao farol uma igreja franciscana, construída em 1654, e perto deles se achava o lugar da casa de Simão, o Curtidor, onde o apóstolo Pedro morou por algum tempo e teve uma visão que mudou o mundo. Ao ouvir a voz de Deus dizendo que deveria aceitar tanto gentios como judeus na igreja, Pedro respondeu: “Reconheço por verdade, que Deus não faz acepção de pessoas; pelo contrário, em qualquer nação, aquele que o teme e faz o que é justo lhe é aceitável”. (Atos 10.34-35).
A partir desse momento a mensagem de Cristo espalhou-se de Jope para Cesaréia e até os confins da terra, tocando toda a humanidade.
Enquanto seguíamos de carro pela estrada Haganah até o aeroporto de Lod, eu fiquei imaginando: – Será que vou ver de novo este lugar? – Pensei nas freiras católicas que haviam me ensinado com tanto amor. Teria visto o rosto delas pela última vez?
Ao atravessarmos as águas do Mediterrâneo, olhei ao longe e disse meu derradeiro adeus a Haifa . Tinha um nó na garganta. A cidade fora um lar para mim em meus quatorze anos de vida.

Sorvete no quiosque


A família Hinn chegou a Toronto em julho de 1968 sem qualquer propaganda. Era assim que meu pai queria. Não tivemos comitê de recepção e não havia um emprego em vista para ele.
Chegamos com a roupa do corpo, alguns bens nas malas e um pouco de dinheiro das vendas de nossas coisas em Haifa. Era o suficiente para vivermos por um breve espaço de tempo
Nossa nova vida começou num apartamento alugado. Que choque aterrissar de repente numa cultura “estrangeira”. Eu conseguia gaguejar em várias línguas, mas o inglês não era uma delas. “Um, dois, três” era o máximo que sabia. Meu pai, no entanto, havia estudado inglês suficientemente bem para preencher um pedido de emprego. E teve êxito.
“Ele aceitou o desafio de tornar-se, dentre todas as coisas, um vendedor.”
Não sei se foi o peso de ter de sustentar uma grande família ou a sua confiança natural em tratar com as pessoas, mas o fato é que meu pai se tornou um sucesso imediato em sua recém descoberta profissão. Antes que se passassem muitos meses, nos mudamos para a nossa nova casa. Estávamos todos orgulhosos dela.
A vida mudou rapidamente para mim. Em vez de freqüentar uma escola católica particular, fui para uma escola pública. A Escola Secundária George Vanier. Como a maioria dos garotos na escola trabalhava meio período, eu também quis fazer o mesmo.
Vivíamos no distrito North York de Toronto e não muito distante de nós fora aberta a nova Alameda Fairview. Eu pedi um emprego num pequeno quiosque que vendia hambúrgueres e sorvete. Embora não tivesse experiência prévia eles me admitiram. Todo dia depois da escola eu ia para lá.
Certo Sábado, porém, entrei numa mercearia e perguntei ao gerente: – Onde está o óleo de oliva? Quero o maior frasco ou lata que tiver.
Ele encontrou um frasco bem grande e me deu. No dia seguinte eu entrei orgulhoso na igreja ortodoxa grega e cumpri o voto que fizera a Deus. Coloquei o óleo na frente do altar e disse baixinho: – Obrigado, Senhor. Obrigado por nos trazer em segurança para o nosso novo lar.
Meu coração estava tão cheio quanto aquele frasco de óleo.
Eu trabalhava o melhor possível no quiosque. Por causa da minha gagueira, não conversava muito, mas me tornei perito em colocar o sorvete nas casquinhas. Eu trabalhava com um rapaz chamado Bob.

Bob tinha perdido o juízo?

Não vou me esquecer daquele dia em 1970 quando cheguei ao trabalho e descobri que Bob tinha feito uma coisa muito estranha. Ele colocara em todas as paredes do quiosque pequenos pedaços de papel com versículos bíblicos escritos neles. Pensei que ficara maluco.
Eu sabia que ele era cristão, pois me contara. Mas aquilo não era um pouco demais?
Disse a mim mesmo: - Por que será que fez isso? Será para mim? Provavelmente conheço melhor a bíblia do que ele.
Finalmente perguntei: - Qual a razão desses papeizinhos? – Bob começou imediatamente a dar-me o seu testemunho. Achei que não iria acabar nunca. Quando terminou, decidi que ficaria o mais longe possível daquele sujeito amalucado.
Tentei evitá-lo ao máximo. Mas foi quase impossível, pois trabalhávamos juntos.
Ele tocava no assunto de religião a toda hora. Mais que isso, porém, ele queria falar sobre o “novo nascimento”, uma frase que não estava em meu limitado vocabulário, nem em meu conceito da Escritura.
Bob finalmente deixou o quiosque, mas muitos de seus amigos freqüentavam a minha escola. Nos dois anos que se seguiram, tomei cuidados extremos para evitá-los. Eu pensava: - Eles são um bando de excêntricos. – Eles pareciam realmente estranhos.
Falavam de modo estranho. Eram o completo oposto das freiras que me haviam ensinado.
Durante meu último ano na Georges Vanier, pela segunda vez em minha vida, tive um encontro com o Senhor. Ele entrou em meu quarto para visitar-me, desta vez na forma de um sonho inesquecível.
Em Haifa, aos onze anos, a visão de Jesus de pé em minha  frente deixara uma impressão indelével. Mas agora, em Toronto, o fato não aconteceu enquanto estudava a Escritura. Eu ainda freqüentava a igreja, mas o evento ocorreu inesperadamente, e fiquei aturdido com a experiência.
Quero contar-lhe exatamente o que aconteceu em meu quarto naquela noite fria de fevereiro de 1972.
Em meio ao sonho, eu comecei a descer uma escada escura e comprida. Ela era tão íngreme que pensei que ia cair e seguia em direção a um abismo sem fundo.
Eu estava preso por uma corrente a um prisioneiro à minha frente e outro atrás de mim. Minhas roupas eram as de um sentenciado. Havia cadeias em meus pés e ao redor do meu pulso. Tanto na frente como atrás de mim a fila de cativos era infindável.
Depois disso, na névoa sinistra daquele poço mal iluminado, vi um grande número de pessoas pequeninas se movendo. Eram parecidas com duendes, com orelhas de forma estranha. Não podia ver seus rostos e suas formas mal se distinguiam, mas estávamos sendo obviamente empurrados escada abaixo por eles, como uma manada de gado para o matadouro – ou pior ainda.
De súbito, vindo de não sei onde, apareceu o anjo do Senhor. Oh, como foi maravilhoso contemplá-lo. O ser celestial pairou um pouco à minha frente, a apenas alguns passos.
Eu jamais vira algo assim antes, nem mesmo em sonhos. Um anjo luminoso e belo no meio daquele buraco escuro e tenebroso.
Quando olhei de novo, o anjo fez sinal para aproximar-me. Ele olhou então em meus olhos e me chamou.
Meus olhos se ficaram fixos e comecei a andar na sua direção. As cadeias caíram instantaneamente de minhas mãos e pés. Eu não estava mais preso aos meus companheiros.
O anjo me levou apressadamente através de uma porta e no momento em que penetrei na luz, o ser celestial me tomou pela mão e me deixou cair na estrada Don Mills, bem na esquina da Escola Georges Vanier. Ele me deixou a poucos centímetros do muro da escola, bem ao lado de uma janela.
O anjo desapareceu num segundo e eu acordei cedo e corri para a escola, para estudar na biblioteca antes das aulas começarem.

Eu mal podia piscar

Enquanto estava ali sentado, sem sequer pensar no sonho, um pequeno grupo de estudantes veio em minha direção. Eu os reconheci imediatamente. Eram aqueles que tinham ficado me aborrecendo com toda aquela conversa sobre “Jesus”.
Eles me convidaram para participar de sua reunião de oração matutina. A sala ficava ao lado da biblioteca. Pensei: – Vou livrar-me deles para sempre. Uma pequena reunião de oração não vai me prejudicar.
Respondi: – Está bem – e fomos juntos para a sala. O grupo não era grande, apenas 12 ou 15 garotos. E a minha cadeira ficava bem no meio.
De repente, o grupo inteiro levantou as mãos e começou a orar em línguas engraçadas e desconhecidas. Eu nem sequer fechei os olhos. Mal podia piscar. Ali estavam alunos com 17, 18, 19 anos de idade, rapazes que eu havia conhecido na aula, louvando a Deus com sons ininteligíveis.
Eu jamais ouvira mencionar o falar em línguas e fiquei atônito. Pensar que Benny se achava numa escola pública, em propriedade pública, sentado no meio de um bando de fanáticos, estava além da minha compreensão.
Não orei, fiquei só observando.
O que aconteceu em seguida foi mais do que eu poderia ter imaginado. Fui tomado por uma estranha vontade de orar. Mas eu não sabia o que dizer. A “Ave Maria”, não me parecia apropriada para o que estava sentindo. Eu jamais aprendera a “oração do pecador“ em qualquer uma de minhas aulas de religião. Tudo que conseguia lembrar de meus encontros com o “povo de Jesus” era a frase: “Você precisa conhecer Jesus”.  Essas palavras pareciam deslocadas para mim porque eu achava que O conhecia.
Foi um momento embaraçoso. Ninguém estava orando comigo ou sequer por mim.
Todavia, a atmosfera espiritual mais intensa que já sentira me cercava. Seria eu um pecador? Não achava que era. Eu era apenas um bom rapazinho católico, que orava todas as noites e confessava o seu pecado quer necessitasse ou não.
Mas naquele instante fechei os olhos e disse três palavras que mudaram a minha vida para sempre. Eu disse em voz alta: – Volte, Senhor Jesus.
Não sei por que falei isso, mas foi só o que saiu da minha boca. Repeti várias vezes essas palavras: – Volte, Senhor Jesus, Volte, Senhor Jesus.
Eu pensava que Ele saíra da minha casa ou de minha vida? Na verdade não sabia.
Mas no momento em que pronunciei essas palavras um sentimento estranho me envolveu, levando-me de volta ao torpor que sentira aos onze anos. Era menos intenso, mas a voltagem daquela mesma força se repetira em mim. Ela me atravessava.
O que realmente percebi, no entanto, foi aquela onda de poder me purificando – instantaneamente, de dentro para fora. Eu me senti absolutamente limpo, imaculado e puro.
De repente via a Jesus com os meus próprios olhos. Aconteceu num momento. Ali estava Ele, Jesus.

Cinco para as oito

Os alunos ao meu redor não podiam saber o que se passava comigo. Estavam todos orando. A seguir, um a um, eles começaram a sair da sala dirigindo-se para as classes.
Faltavam cinco minutos para as oito horas da manhã. A essa altura eu me encontrava ali sentado, chorando. Não sabia o que fazer nem o que dizer.
Não entendi na hora o que ocorrera, mas Jesus se tornou tão real para mim como o chão debaixo dos meus pés. Eu não fiz qualquer oração, além daquelas três palavras.
Sabia, porém, sem qualquer dúvida, que algo extraordinário acontecera naquela manhã de fevereiro.
Atrasara-me para a aula de História, que era uma das minhas matérias favoritas.
Estávamos estudando a Revolução Chinesa. As palavras do professor ficaram, entretanto, perdidas para mim. Não me lembro de nada do que foi dito. A sensação que começara naquela manhã não me abandonava. Cada vez que eu fechava os olhos, ali estava Ele – Jesus. E mesmo quando abria os olhos, Ele continuava ali. O semblante do Senhor não me deixava.
Fiquei enxugando as lágrimas dos olhos o dia inteiro. E a única coisa que podia dizer era: – Jesus, eu O amo... Jesus, eu O amo.
Quando saí da escola andei pela calçada até a esquina, olhei para a janela da biblioteca e as peças do quebra-cabeça começaram a se encaixar.
O anjo. O sonho. Tudo voltou.
O que Deus estava querendo dizer-me?
O que ocorria com Benny?

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